Relatos

Cleide Borges de Abreu

EDUCAÇÃO DA VIDA: MENTE, CORPO E MEIO AMBIENTE

RESUMO: Este projeto, fundamentado em teorias e procedimentos da Educação da Vida, do Prof. Masaharu Taniguchi, objetivou o estudo das influências de pensamentos, falas e atitudes no meio ambiente, e a realização de atividades com a comunidade participante, de modo que tais influências pudessem ser benéficas. Os resultados mostraram melhoras no desempenho escolar dos alunos, nas relações pessoais, diminuição de desperdício de água, resíduos e serviu de estímulo a outros projetos ambientais.
Palavras-chave: Meio ambiente e espiritualidade, projeto educacional.

INTRODUÇÃO
Este projeto, realizado no contexto do curso de extensão universitária Ciclo de Estudos da Educação da Vida, parceria da Associação de Educadores da Seicho-No-Ie, Reg. MT-Cuiabá, com o Depto. de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso, foi desenvolvido com alunos, familiares, vizinhos da Escola MAEC/Cuiabá, no período de agosto-novembro/2010. Foi fundamentado em teorias e procedimentos voltados para a educação de crianças, para a educação formal, elaborados pelo Prof. Masaharu Taniguchi, conhecidos como Educação da Vida.
A ideia surgiu quando comecei a observar a precária situação do lixo nas ruas de Cuiabá. Vi muito lixo espalhado, bueiros entupidos com sacos plásticos, garrafas pet, latinhas de alumínio etc. Conclui que as enchentes dos últimos anos foram causadas em grande parte pelo acúmulo desses resíduos.
Numa visita ao aterro sanitário, constatei que a capacidade de recepção do lixo em Cuiabá está no limite e novos aterros terão que ser construídos urgentemente. Em média, o atual aterro recebe 470 t diárias de resíduos e, nos finais de semana, 720 t.
O sistema capitalista incentiva o consumo, mas não educa os cidadãos para a adequada gestão do lixo e, progressivamente, faz a retirada de matéria prima em diversos níveis da natureza, mais do que ela pode oferecer, causando um crescente dano ao meio ambiente. Há algumas ações isoladas de empresas que tentam minimizar o problema, mas não há políticas públicas que possam conscientizar permanentemente a população.
No entanto, o problema não é somente externo. Aprendemos na SEICHO-NO-IE que os seres animados e inanimados formam uma unidade indivisível. Nesse sentido, há relações entre a mente humana e o meio ambiente.

Com base nessas reflexões elaborei este projeto. A primeira providência para se resolver o problema do meio ambiente é conscientizar o homem de que ele é Filho de Deus. “A montanha, o rio, a erva, a árvore, todos os seres vivos, tudo é automanifestação do amor de Deus”, explica o Prof. Masaharu Taniguchi (vol. I, 1999, p.50). É preciso evitar o “lixo mental” produzido diariamente: mágoas, tristezas, medo, enfatizando que eles são a origem de sofrimentos e de doenças.
Considerando que o homem é originariamente bom, deve manifestar a sua condição natural em todos os sentidos: sua capacidade infinita, bom relacionamento familiar, êxito nos estudos, vida saudável. Quando a pessoa se harmoniza consigo e com as coisas, o ambiente passa a refletir essa harmonia e a pessoa passa naturalmente a respeitar o meio em que vive. Assim foi feito.
Fazendo parte do processo de educação, a outra providência foi conscientizar a comunidade participante a consumir menos, reciclar, reaproveitar materiais, destinar adequadamente o lixo gerado no dia a dia, criando vínculo afetivo com seus lares e com a escola. Do afeto, nasce a responsabilidade e o sentimento de cuidado, no caso, do lixo produzido. Tanto a família como a escola tem a responsabilidade de participar da construção desses valores básicos da consciência cidadã dos seus filhos/alunos, para que no futuro eles tenham hábitos éticos, sadios e responsáveis, relacionados à preservação da Terra.

OBJETIVO GERAL
Por meio do estudo dos princípios e procedimentos da Educação da vida, de autoria do Prof. Masaharu Taniguchi, promover a formação integral dos alunos, no sentido de viverem em harmonia consigo mesmos e com o meio ambiente.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Entender a importância da limpeza para a saúde física, mental e espiritual de modo a desenvolver uma relação harmoniosa com as pessoas e com a natureza; desenvolver uma visão local dos problemas ambientais relacionados à falta de reciclagem do lixo; analisar as diversas formas de diminuir a destruição da natureza; sensibilizar a comunidade escolar para a necessidade de gerenciar os resíduos resultantes das atividades, minimizando a sua produção e aumentando a sua reciclagem, contribuindo para evitar a contaminação do solo e dos rios; aprender a usar os cestos de lixo, mantendo o ambiente limpo; promover a conscientização a respeito do uso racional da água e do seu valor; construir uma visão sistêmica sobre o lixo, desde a sua produção, passando pela coleta e alcançando seu destino correto.

METODOLOGIA
O projeto foi desenvolvido durante os meses de agosto a novembro de 2010, uma vez por semana, com aula expositiva e prática. Fizemos uso dos seguintes procedimentos:

 

 Comunicação contínua envolvendo a família no trabalho escolar por meio de escrita formal (comunicados oficiais) e informal (bilhetes); reuniões para solicitação de estímulo aos filhos na realização das tarefas, de modo a assegurar a todos um bom aprendizado e envolvimento no projeto.
 Estabelecimento de parceria com a Indústria de Refrigerantes Marajá, que doou sacolas grandes, para guardar os resíduos separados, e que fazem parte do programa de responsabilidade social dessa empresa.
 Antes de iniciar as aulas e em outros momentos: agradecimentos, entoação de hinos e canções, treino de palavras positivas, orações, meditações, práticas recitativas, leitura da Revelação Divina da Grande Harmonia.
 Reflexão sobre gratidão e amor à Pátria, à natureza, aos pais e amigos; reflexão sobre o sentimento de amor e gratidão a Deus; prática do elogio ao próximo.
 Estudos científicos: Como reduzir a produção de resíduos físicos resultantes das ações diárias. Reutilizar o máximo possível. Reciclar: o poder da transformação. Água: um dos recursos mais preciosos do planeta. Evitar desperdícios.
 Estímulo ao recolhimento de resíduos, pelos alunos, nas residências e nas ruas.
 Visitas externas com os alunos: Estação de Tratamento de Água, esgoto, aterro sanitário, locais onde é jogado lixo a céu aberto; ao Rio Cuiabá, onde é captada água para tratamento; a uma fonte de água mineral, em Chapada dos Guimarães; ao parque ecológico urbano Mãe Bonifácia (ambiente preservado).
 Jogos, brincadeiras, reciclagem de materiais, assistência a vídeos educativos, leitura de histórias infantis, músicas, gincanas.
 Feira envolvendo materiais produzidos com sucatas, um desfile de roupas customizadas; palestras; organização de mural com o tema estudado, produção de desenhos, cartazes e doação de mudas de árvores.
Como estava coordenando e executando as atividades, para que as ações tivessem êxito, meus procedimentos como educadora foram: ficar em sintonia com Deus, através da meditação Shinsokan, visualizando a essência dos alunos e seus familiares; leitura de sutras nas salas de aula, no início e término das aulas; purificação do ambiente escolar com preletor convidado no período de aula para envolver todos os alunos e professores; cerimônia de gratidão aos antepassados dos donos da escola e dos antepassados do local onde ela está construída; forma humana para os alunos e familiares que manifestassem aspectos fenomênicos distorcidos; inteirar-me sempre de tudo o que envolveu o Projeto, para que ele pudesse ser desenvolvido com qualidade e seriedade; embasar minhas propostas nas Revelações Divinas da SEICHO-NO-IE, no contexto da Educação da Vida.


E sempre acreditar que: eu posso fazer o melhor, porque sou filha de Deus.

RESULTADOS
Os resultados de nossas ações com este projeto foram muito bons.
Quanto às práticas espirituais, fizemos a Meditação Shinsokan, a prática de Recitação da Grande Harmonia e a Purificação da Mente. Fiz visita de benção em casas de alunos com dificuldade de relacionamento, formas humanas para pais e alunos com problemas de doenças ou desarmonia, cartões de bênçãos (que constam nas revistas publicadas mensalmente pela SEICHO-NO-IE) para todos os alunos, pais e professores. Também foram enviados aos pais textos retirados dos livros da SEICHO-NO-IE, cujo conteúdo foi colocado em prática. Organizamos ainda seis reuniões de mães orientadas por preletoras da Reg. MT-Cuiabá.
Durante as aulas, fizemos comparações entre o lixo mental, ou seja, pensamentos e atos negativos, e o lixo físico, propriamente dito. Observei que as crianças mudaram a maneira de pensar e agir para melhor, principalmente os alunos do 3º, 4º e 5º anos. Eu, mais que todos, tive a oportunidade de refletir muito, e cheguei ao ponto de questionar quem realmente eu sou e o que eu estou fazendo no meio de tantos resíduos mentais. Mas, com muito esforço, estou limpando o subconsciente com práticas, orações, leituras das obras da Seicho-No-Ie.
Refletimos, através de vídeos, textos escritos e textos musicais sobre os bens naturais que Deus deu ao homem, e que estão sendo destruídos. Todos ficaram sensibilizados. Estudamos sobre a produção de resíduos, os vários tipos e a sua destinação correta.
As crianças trouxeram sacos plásticos, papelão, garrafas pet, caixas de leite longa vida e latinhas de alumínio. Tivemos boa participação, tanto das crianças, quanto dos pais. As crianças foram bem receptivas e ficaram admiradas, pois não sabiam que o lixo produzido por nós, e jogado em qualquer lugar, podia causar tantos danos para o solo, os rios e, consequentemente para o planeta Terra.
Realizamos uma feira com materiais reutilizados, reformados. Vários alunos disseram que tinham móveis usados para reformar, reutilizar. Fizemos também um desfile com roupas customizadas, com o objetivo de levar as pessoas a refletir que roupas usadas também podem ser reformadas, reutilizadas e é possível até montar uma loja com roupas customizadas. As meninas do 3º ao 5º ano ficaram admiradas com as camisetas que foram customizadas. Disseram que iriam customizar as roupas usadas, pois aprenderam como poderão reaproveitá-las (essas são palavras delas). É importante, ressaltar que esta feira utilizou materiais recolhidos do lixo existente nos vizinhos e em outros bairros da cidade, que recolhi ao andar pela cidade e observar algum objeto, madeira e outros, que poderia ser reutilizado ou transformado e fazia isso com os alunos. Fui criticada pelo fato de ser diretora de uma escola e ficar tentando gerenciar o lixo existente na vizinhança, pois os vizinhos estavam em processo de conscientização nos primeiros contatos.
Fizemos as visitas programadas: ao aterro sanitário de Cuiabá, aonde vimos que tudo é bem organizado, os resíduos são separados por cores, alguns tipos de plásticos vão para fábricas de reciclagem no bairro Cristo Rei, em Várzea Grande e, outros, para cidades como São Paulo e Curitiba; passamos por lugares onde o lixo é jogado a céu aberto, como na saída para a cidade de Chapada dos Guimarães; fizemos aulas de campo na Estação de Tratamento de Água da SANECAP, que despertou a curiosidade dos alunos, pois ali fizeram muitas perguntas, além de terem a explicação da profissional responsável; passamos pelo Parque Mãe Bonifácia, reserva ecológica urbana bem conservada, onde os alunos se divertiram muito.
Ao final do projeto, a turma que mais arrecadou resíduos recicláveis foi premiada com uma visita na Indústria de Refrigerantes Marajá com comemoração incluindo lanche, refrigerantes e premiação com brinquedos. Ficou na Indústria um quadro com fotografia dos alunos, o nome da escola e a quantidade de resíduos recolhidos. As crianças ficaram felizes e se sentiram muito importantes.
Embora tenhamos tido êxito, tivemos dificuldades de realizar o projeto: quatro meses foi pouco para trabalhar um assunto tão complexo; conscientizar nossos alunos e professores a respeito de não deixar o lixo espalhado, nas salas e no pátio da escola, a evitar desperdícios de água, pois as torneiras ficavam abertas o tempo todo; organizar a fila no início da aula e fazer as orações (como a maioria dos alunos é evangélica, não entendiam a proposta da meditação); falta de espaço para guardar os resíduos, que foram colocados em um canto da quadra de esportes, limitando o espaço das crianças brincarem; dificuldade de recepção dos resíduos, pois não havia uma pessoa exclusiva para isso. A recepção dos resíduos foi feita da seguinte maneira: os pais entregavam os resíduos para a professora de seu filho, que fazia a contagem, os alunos os levavam para o pátio; no fim da tarde, eu os guardava já separados por tipo, nos vasilhames. Ocorreu que, quando não tinha esse tempo, as crianças começavam a brincar com os materiais, e acabavam espalhando-os pelo pátio da escola. Isso me preocupava, pela segurança dos próprios alunos. Por outro lado, as crianças se sentiam felizes ao saber que estavam colaborando para que este lixo não fosse parar nos bueiros, entupindo-os, ou poluindo os rios.
Durante esse período, fomos nos adequando, até chegar ao ponto certo de ter uma sacola grande para separar tipos diferentes de resíduos: garrafas pet, latinhas, caixas de leite longa vida e papelão. Toda sexta-feira, nossa parceira, a Indústria de Refrigerantes Marajá recolhia o material coletado durante a semana.
As dificuldades iam sendo resolvidas com as práticas da Educação da Vida, com a afirmação das palavras positivas. As aulas eram realizadas de forma dinâmica, sempre com ênfase na unicidade e interação entre os seres. As atividades do projeto foram realizadas fora das salas, sendo que nossa escola está localizada num terreno com 1.080m2 de área, com árvores frutíferas, pés de Ipê, onde podíamos ver e ouvir diariamente o canto de uma variedade de pássaros. Só quem os viu e ouviu, pode falar da emoção que sentimos durante todo o projeto. Aprendemos que o planeta está vivo, e precisa da dedicação de cada um de nós.
Ficamos de tal modo envolvidos nessa tarefa, que a mente do grupo ficou una, coesa e realizamos tudo com muito amor e empenho. Aumentou em todos a certeza de sermos feitos à imagem e semelhança de DEUS, dotados de capacidade infinita.

Conclui-se, assim, que a terra é um corpo vivo de Kunitoko-tachi-no-Mikoto. Por isso, devemos reverenciar o solo. “A Terra também vive – este fato é mais conhecido pelos poetas do que pelos cientistas, pois há poesias que dizem “Baila o solo”, canta a terra”. Conforme o ponto de vista da pessoa, a terra pode parecer um simples mistério ou deus vivo. Ambos são verdades. Mas, quando vemos a terra com o coração de poeta, percebemos que ela vive. (TANIGUCHI, 1989, p. 44)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Avaliando o projeto como um todo, concluímos que foi gratificante, por vários fatores: pela ajuda experiente dos nossos professores, que conhecem e aplicam no cotidiano a Educação da Vida; pelas ações paralelas desenvolvidas, também na área da Educação da Vida, como o projeto sobre os cinco desejos básicos do ser humano: ser amado, ser útil, ser elogiado, ser reconhecido, ser livre; pelo envolvimento dos alunos e dos pais em todas as etapas do projeto. Os alunos ficaram mais calmos, conscientes, não deixando o lixo espalhado, ajudando a controlar o desperdício de água, de materiais didáticos, cuidando melhor da escola. As agressões físicas e pronunciadas acabaram.
Para nossa enorme satisfação e alegria, a turma do 5º ano, com vinte e dois alunos, movidos por esse sentimento de amor, gratidão, fé, participou de um exame de seleção no Colégio Salesiano São Gonçalo, considerado a maior escola de Cuiabá, para concorrer a bolsas de estudo. Dezoito deles passaram com notas máximas e conseguiram bolsa de estudo integral.
Diminuiu gradativamente a conta de água da escola, de R$348,00 para R$116,00. O resultado prático disso foi o de – ao verem uma torneira aberta – já fechá-la imediatamente.
Temos tido notícia de que o nosso projeto está se expandindo para outros lugares. Um exemplo disso é o caso da mãe de uma professora da escola, que ouviu falar sobre a reciclagem de latinhas, viu fotografias dos resíduos e resolveu fazer o mesmo, com outras senhoras. Ela conseguiu reformar e mobiliar sua casa com os lucros da venda dessa embalagem. Também aconteceu de algumas crianças, que não tinham todos os livros necessários, uniformes, e até mesmo o lanche, descobrirem que vendendo os resíduos em uma cooperativa próxima à escola, poderiam comprar os itens citados, ou algo de que necessitavam.
Fiz uma reunião com os alunos para expor esses dados, todos ficaram muito felizes. Ao término desse projeto, que se deu em 30/12/2010, nós, da equipe, com as crianças, sentimos nossa mudança interior e exterior, despertando cada vez mais a consciência de que somos filhos de Deus, perfeitos e abençoados.
Foi um processo de reeducação que nos estimulou a sermos responsáveis na hora do consumo e tomarmos a firme decisão de reutilizar, reduzir, reformar, encaminhar o lixo que produzimos para ser reciclado, procurando comprar produtos com embalagens que possam ser recicladas.